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Conselhos municipais e controle social
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O controle social pode ser feito individualmente, por qualquer cidadão, ou por um grupo de pessoas. Os conselhos gestores de políticas públicas são canais efetivos de participação, que permitem estabelecer uma sociedade na qual a cidadania deixe de ser apenas um direito, mas uma realidade. A importância dos conselhos está no seu papel de fortalecimento da participação democrática da população na formulação e implementação de políticas públicas.
Os conselhos são espaços públicos de composição plural e paritária entre Estado e sociedade civil, de natureza deliberativa e consultiva, cuja função é formular e controlar a execução das políticas públicas setoriais. Os conselhos são o principal canal de participação popular encontrada nas três instâncias de governo (federal, estadual e municipal).
Os conselhos devem ser compostos por um número par de conselheiros, sendo que, para cada conselheiro representante do Estado, haverá um representante da sociedade civil (exemplo: se um conselho tiver 14 conselheiros, sete serão representantes do Estado e sete representarão a sociedade civil). Mas há exceções à regra da paridade dos conselhos, tais como na saúde e na segurança alimentar. Os conselhos de saúde, por exemplo, são compostos por 25% de representantes de entidades governamentais, 25% de representantes de entidades não-governamentais e 50% de usuários dos serviços de saúde do SUS.
Responsabilidades dos Conselhos

Conselho de Alimentação Escolar
  • Controla o dinheiro para a merenda. Parte da verba vem do Governo Federal. A outra parte vem da prefeitura.
  • Verifica se o que a prefeitura comprou está chegando nas escolas.
  • Analisa a qualidade da merenda comprada.
  • Olha se os alimentos estão bem guardados e conservados.

Conselho Municipal de Saúde
  • Controla o dinheiro da saúde.
  • Acompanha as verbas que chegam pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e os repasses de programas federais.
  • Participa da elaboração das metas para a saúde.
  • Controla a execução das ações na saúde.
  • Deve se reunir pelo menos uma vez por mês.

Conselho de Controle Social do Bolsa Família
  • Controla os recursos do Programa.
  • Verifica se as famílias do Programa atendem aos critérios para fazer parte.
  • Verifica se o Programa atende com qualidade às famílias que realmente precisam.
  • Contribui para a manutenção do Cadastro Único.

Conselho do Fundef
  • Acompanha e controla a aplicação dos recursos, quanto chegou e como está sendo gasto. A maior parte da verba do Fundef (60%) é para pagar os salários dos professores que lecionam no ensino fundamental. O restante é para pagar funcionários da escola e para comprar equipamentos escolares (mesas, cadeiras, quadros-negros, etc.).
  • Supervisiona anualmente o Censo da Educação.
  • Controla também a aplicação dos recursos do programa Recomeço (Educação de Jovens e Adultos) e comunica ao FNDE a ocorrência de irregularidades.

Conselho de Assistência Social
  • Acompanha a chegada do dinheiro e a aplicação da verba para os programas de assistência social. Os programas são voltados para as crianças (creches), idosos, portadores de deficiências físicas.
  • O conselho aprova o plano de assistência social feito pela prefeitura.
Fonte: http://www.portaltransparencia.gov.br


Novo ciclo
Marcio Pochmann

O esgotamento do projeto desenvolvimentista imposto pela crise da dívida externa no início da década de 1980 não tornou o País órfão de um modelo econômico e social por muito tempo. A partir do fim dos anos oitenta do século passado, o Brasil internalizou gradualmente o modelo neoliberal. 

O entendimento de que o Estado faria parte apenas dos problemas existentes levou à formulação de diversas profecias que não foram realizadas com o passar dos anos. Exemplo disso foi o próprio comportamento econômico durante os anos de hegemonia neoliberal. Pelo lado internacional, constatou-se que a opção pela inserção passiva e subordinada gerou grande fragilidade externa. Cada instabilidade externa produzia internamente a interrupção da expansão produtiva e enormes consequências sociais negativas. 

Com isso, a variação média anual do Produto Interno Bruto (PIB) foi de apenas 2,3%, favorecendo a financeirização da riqueza como medida de compensação crescente à tendência de baixa na taxa média de lucro do setor produtivo. Assim, coube ao Estado a submissão plena ao regime de ajustes fiscais permanentes por meio do contingenciamento ao gasto público, da privatização do setor produtivo estatal e da elevação da carga tributária. 

A opressão do gasto público se revelou necessária à eficácia da macroeconomia financeira, responsável pela transferência média anual de mais de 6% do PIB na forma de pagamento de juros aos segmentos rentistas. Mas o ajuste fiscal permanente trouxe, em consequência, o desajuste social, uma vez que as regiões metropolitanas mantiveram a taxa de pobreza acima de 2/5 da população, e mais de 1/3 dos brasileiros submetidos à condição de baixa renda. 

Ao disciplinar 19% do PIB para o gasto social, a experiência neoliberal comprimiu a expansão real do salário mínimo, bem como manteve menos de 14% da população receptores de medidas de garantia mensal de renda. A desigualdade na renda do trabalho manteve-se próxima de 0,6 no índice de Gini, enquanto a participação do rendimento do trabalho ficou abaixo de 40% da renda nacional. 

Nos últimos anos, contudo, o Brasil passou a acusar importantes sinais de transição para o modelo social-desenvolvimentista. A identificação básica de que o Estado faz parte das soluções dos problemas existentes não implicou reproduzir os traços do velho modelo nacional desenvolvimentista vigente entre as décadas de 1930 e 1970. Pelo contrário. De um lado, pela reafirmação da soberania nacional, o que exigiu uma profunda reorientação da inserção internacional, com a passagem da condição brasileira de devedor para a de credor de organismos multilaterais (FMI), a formação de significativas reservas externas e o redirecionamento do comércio externo e cooperação técnica para o âmbito das relações Sul-Sul. Assim, as crises externas deixaram de expor a sociedade brasileira às mesmas dificuldades observadas durante a vigência passada do modelo neoliberal. 

De outro lado, os compromissos firmados com o avanço do sistema produtivo permitiram a expansão econômica nacional anual na média de 4,2%, bem como a queda da despesa pública com a financeirização da riqueza para quase 2 pontos percentuais do PIB inferiores aos vigentes durante o predomínio do modelo neoliberal. Com isso, houve tanto a ampliação no gasto social para 22% do PIB (quase 3 pontos percentuais a mais do que nos anos 1990) como o atendimento de mais de 1/3 da população brasileira com mecanismos de garantia mensal de renda. 

O resultado social se mostrou evidente, com a queda na taxa de pobreza para menos de 1/3 da população e a desigualdade de renda do trabalho abaixo de 0,40 do índice de Gini nas regiões metropolitanas. A recente volta da mobilidade social, que inclui no consumo de massa milhões de brasileiros e transforma a antiga figura da pirâmide social numa nova, parecida com uma pera, mostra-se fruto do avanço do ainda incompleto social-desenvolvimentismo. Os próximos anos, se este modelo for mantido e aprofundado, poderão indicar o quanto pode ser reduzida a distância que separa o país real daquele que os brasileiros acreditam realmente que possa vir a ser.
Marcio Pochmann é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O artigo foi publicado no jornal O Globo.
Fonte: www.ipea.gov.br

O impasse no Estado
A trajetória recente do desenvolvimento brasileiro permite que o debate político atual possa se concentrar cada vez mais sobre o futuro próximo que o conjunto da sociedade almeja para o país. Até pouco tempo, contudo, o foco das discussões encontrava-se aprisionado, quando não no passado, na emergência do "curtoprazismo".

Marcio Pochmann

A trajetória recente do desenvolvimento brasileiro permite que o debate político atual possa se concentrar cada vez mais sobre o futuro próximo que o conjunto da sociedade almeja para o país. Até pouco tempo, contudo, o foco das discussões encontrava-se aprisionado, quando não no passado, na emergência do "curtoprazismo".

Esse patamar de maturidade alcançado ao longo dos últimos 25 anos pelo processo de consolidação democrática resulta de certos êxitos obtidos pelo reposicionamento do Estado mais recentemente. Recorda-se que a reforma do Estado defendida na década de 1980 terminou sendo inviabilizada pela forma com que as alianças políticas em prol da redemocratização foram conduzidas.

A nova República teve o inegável mérito de consagrar tanto a transição democrática como a geração da Constituição Federal que reconectou o país nas possibilidades contemporâneas de modernização. Nos anos 1990, contudo, o Estado foi tratado como fundamento principal dos problemas nacionais, passando, por conta disso, por medidas de desconstrução que apontaram para um dos maiores procedimentos de concentração de renda e riqueza da história nacional. Três foram os principais procedimentos adotados para consagrar a brutal transferência de ativos financeiros e econômicos do país. O primeiro referiu-se à opção dos governos de plantão pela elevação do endividamento público, o que permitiu transferir - em menos de uma década - cerca de 1/5 do Produto Interno Bruto (PIB) à cúpula da pirâmide social na forma da financeirização da riqueza.

O segundo procedimento se deu por intermédio do processo de privatização do setor produtivo estatal. Quase 1/6 do PIB foi transferido da propriedade pública para mãos privadas nacionais e estrangeiras, o que possibilitou transformar os já muito enriquecidos nacionalmente em super ricos na escala global. Por fim, o terceiro procedimento resultou do dramático aumento da carga tributária no país. Acontece que a elevação da tributação no montante equivalente a 1/10 do Produto Interno Bruto nacional se deu fundamentalmente sobre a base da pirâmide social brasileira.

Ou seja, a população com remuneração de até dois salários mínimos mensais, que pagava tributos responsáveis pela absorção de quase 1/3 de seu rendimento, passou recolher quantia equivalente à metade de seus ganhos mensais. Na cúpula da pirâmide social, a ausência de tributos específicos, bem como a ação do planejamento tributário, continuou permitindo a evasão contributiva continuada da arrecadação tributária nacional.

Em pleno regime de débil dinamismo produtivo, o ajuste fiscal permanente promovido pelas políticas governamentais da década de 1990 favoreceu significativamente os interesses da parcela privilegiada dos brasileiros. Nesse sentido, observa-se que o Estado era concebido como problema enquanto incapaz de oferecer alternativas necessárias à sustentação da riqueza aos segmentos impossibilitados de elevar seus ganhos por meio do baixo dinamismo produtivo. A opção pela macroeconomia da financeirização da riqueza, fundada no ajuste "permanente" das finanças públicas, abriu caminho para que quantia equivalente a 45% do PIB fosse transferida de pobres para ricos no Brasil conduzido pelo neoliberalismo.

A recente volta do vigor econômico apontada pela maior dinâmica do setor produtivo, que cresce quase duas vezes mais que a experiência da década de 1990, permitiu novas escolhas para o reposicionamento do Estado nacional. Sem o abandono do compromisso com a estabilidade monetária, foi possível começar a reorientação da condução das políticas públicas, abrindo cada vez mais oportunidades de apoio também à base da pirâmide social.

Em resumo, o Estado deixou de ser tratado como problema, para assumir a condição de parte das soluções do conjunto dos problemas nacionais. Ao mesmo tempo em que o processo de endividamento público retrocedeu em relação ao PIB, o setor público estatal foi orientado para contribuir no financiamento do investimento voltado, entre outras áreas, para a ampliação da matriz energética, da infraestrutura econômica e social. De um lado, bancos públicos vistos como improdutivos e passíveis de privatização foram resgatados e recolocados na marcha da função de apoio à produção e ao desenvolvimento nacional. De outro, empresas estatais que ainda não haviam sido privatizadas foram reconectadas ao esforço maior de executar suas missões de apoio ao crescimento estratégico da produção.

Toda essa reorganização do Estado brasileiro encontra-se incompleta. Mas seus resultados são inequívocos, especialmente em relação à experiência da década de 1990. Há, ainda, muito a ser feito. Mas isso, todavia, comporá parte do debate sobre os rumos do Brasil dos próximos anos. Para onde seguir. No mesmo sentido do fortalecimento do Estado como condição básica do projeto de desenvolvimento nacional com justiça social e sustentabilidade ambiental?

Quando se analisa a situação do conjunto dos municípios brasileiros, percebe-se que a presença do Estado ainda encontra-se insuficiente. Mais da metade dos municípios não conta com agências de banco público e estabelecimento público de cultura, enquanto um a cada três municípios não tem estabelecimentos públicos de saúde para atendimentos de urgência e internação. Somente 2,8% dos municípios possuem estabelecimentos públicos de ensino superior.

O sentido do desenvolvimento nacional depende da superação do impasse nacional em torno do Estado. Em 2010, esse debate prosseguirá, guiando o futuro do Brasil.

Marcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor licenciado do Instituto de Economia, é pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas. O artigo foi publicado no jornal Valor Econômico.

 Fonte: www.ipea.gov.br


Estado, Sociedade e Mercado

João Sicsú

As eleições presidenciais de 1989 marcaram o começo da mais intensa campanha pela destruição do Estado brasileiro e de qualquer projeto de desenvolvimento. Fernando Collor foi o abre-alas desse movimento. Fernando Henrique Cardoso colocou todas as energias dos seus governos (de 1995 a 2002) na mesma empreitada. Somente em 2002, com a eleição do presidente Lula, vieram os primeiros sinais de interrupção desse processo. Sinais mais claros de que o Estado entraria em rota de reconstrução apareceram nas eleições de 2006. Hoje, o Estado está em reconstituição.
A fórmula aplicada durante os governos Collor e FHC foi sempre a mesma. Primeiro, com intensa propaganda midiática, desmoralizava-se a entidade (empresa estatal ou instituição pública) que deveria ser vendida, extinta ou atrofiada. Instrumentos invisíveis para o cidadão comum eram utilizados para fazer a instituição definhar, antes de ser levada a leilão. Também o mais valioso ativo, aquele que faz o Estado cumprir suas funções, o servidor público, foi desmotivado e desmoralizado - apelidado de "marajá", que significava no imaginário popular quem recebia, mas não trabalhava.
Empresas estatais foram praticamente doadas; o BNDES foi transformando em banco de investimento (com características de banco privado); a Petrobras quase virou PetroBRAX; o ensino público, gratuito e de qualidade, foi atacado por dentro e por fora. Por dentro, foi atacado através do corte de recursos para investimentos e com a política de defasagem real de salários de professores e funcionários. Por fora, foi atacado com a propaganda de que nas universidades públicas somente estudavam os filhos dos ricos, enquanto os pobres eram ignorados. O sistema público de previdência era desmoralizado com a propaganda diária sobre as "filas do INSS" e, por dentro, era enfraquecido com a redução real do valor dos benefícios pagos.
Hoje não há leilão de empresas estatais. No período 2003-2008, os desembolsos anuais do BNDES cresceram, em termos reais, mais que 60% em relação a 1996-2002. A Previdência Social pagou, em dezembro de 2002, 21 milhões de benefícios. Em dezembro de 2008, pagou mais de 26 milhões. Hoje, o valor médio dos benefícios pagos é quase 20% maior, em termos reais, do que era em 2002. No período 2003-2007, foram criadas 12 universidades públicas federais. Em média, no período 1995-2002, a Petrobras investia por ano 5,6 bilhões de dólares. Em 2003-2008, a média foi de 16,2 bilhões.
Um projeto de desenvolvimento não pode existir sem a liderança do Estado e o envolvimento da sociedade e da iniciativa privada. Portanto, destruir o Estado é o melhor caminho para se destruir o sonho de desenvolvimento de uma sociedade. Mas para que serve o Estado? Para aqueles que acreditam que o desenvolvimento vem dos países desenvolvidos para os países atrasados através de um transbordamento de oportunidades de negócios, o Estado tem um papel muito discreto e um projeto de desenvolvimento não faz sentido. Para aqueles que observam a história verdadeira das nações e, portanto, percebem que o desenvolvimento é um projeto nacional, o Estado é a única entidade capaz de liderar a implantação desse projeto.
Isso porque o Estado é capaz de promover a equalização de oportunidades educacionais e de acesso à saúde. O Estado é capaz de orientar a produção e o investimento privados, que devem crescer de forma permanente, em condições de valorização do ambiente. O Estado é capaz de oferecer segurança de vida a todos, através de um sistema de previdência e de assistência social. O Estado é capaz de promover uma política de moradia digna, direito do cidadão. O Estado é capaz de arrecadar impostos de forma progressiva e gastá-los da mesma maneira, estabelecendo uma distribuição da renda menos desigual. O Estado é capaz de programar políticas anticíclicas, para manter o emprego como um direito. O Estado é capaz de desenvolver e possuir um sistema de defesa nacional tecnologicamente avançado.
Que papel cabe à iniciativa privada, ou ao mercado? O mercado é capaz de produzir alimentos em quantidade suficiente com qualidade cada vez melhor. A iniciativa privada é capaz de produzir bens de consumo para atender às mais diferentes demandas da sociedade. O mercado é capaz de realizar investimentos vultosos e com alta densidade tecnológica. A iniciativa privada é capaz de distribuir bens e serviços, capilarizando o comércio. A iniciativa privada é capaz de participar de projetos grandiosos de construção de moradias, infraestrutura e outros. O mercado é capaz de gerar milhões de empregos e formalizar relações de trabalho, gerando direitos e garantias sociais. A iniciativa privada é capaz de construir bancos e instituições aptos a ofertar crédito e outros serviços. A iniciativa privada é capaz de construir navios, aviões e plataformas de extração de petróleo.
Estado, sociedade e mercado formam o tripé institucional de um projeto de desenvolvimento. Basta que um pé seja enfraquecido para que o projeto venha ao chão. As três partes devem atuar livremente, de forma a produzir sinergias desenvolvimentistas. Por fim, Estado, sociedade e mercado não são concorrentes entre si, mas interagem e constituem os laços fundamentais de um projeto nacional de desenvolvimento.
João Sicsú é diretor de estudos e políticas macroeconômicas do Ipea e professor do Instituto de Economia da UFRJ. O artigo foi escrito para o jornal Valor Econômico.

Fonte: www.ipea.gov.br

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